A rua Viúva Dantas em Campo Grande RJ

Citada em verso e prosa por Vínicius de Moraes , o nome de uma viúva em certa rua no bairro de Campo Grande no Rio de Janeiro é um mistério para os moradores .

O Mundo Ilustrado (RJ) – 1930 a 1963

Uma pista dada em um grupo numa rede social pelo profundo conhecedor do bairro Will Tom ( Facebook ) informava que a viúva seria a esposa de um militar. Mas qual seria o nome da Viúva Dantas?

Anteriormente o logradouro que hoje tem inicio na rua Coronel Agostinho e fim na Avenida Cesário de Melo , era uma rua sem saída.

Almanak Laemmert : Administrativo, Mercantil e Industrial (RJ) – 1891 a 1940

Havia um caminho público que ligava a Estrada Real ( atual Cesário de Melo) com as ruas Viúva Dantas , Nova ( atual Aurélio Figueiredo) e a Estrada de Ferro Central , onde havia uma passagem para a rua Campo Grande ( hoje a passagem subterrânea).

Ocorre que o citado caminho público servia de divisa anterior a 1885, do sitio do Sr Ataliba, um carteiro rural com o sítio do Sr Carlos Italiano. O carteiro então tomou o caminho como patrimônio, incorporando-o a sua propriedade, dessa forma a rua Viúva Dantas se tornava um beco sem saída, fato que causava transtorno para população.

O Paiz (RJ) – 1910 a 1919

A rua foi reconhecida oficialmente sob o Decreto nº. 1.165, de 31/10/1917 e teve dois prolongamentos ao longo dos anos 1948 e 1950.

A iluminação chegou em 1926 .

O Brasil (RJ) – 1922 a 1927

Mesmo sendo uma das vias mais antigas do bairro, na década de 50 a rua ainda não possuía calçamento, apresentava valas com focos de mosquito e era infestada de ratos.

(Imprensa Popular (RJ) – 1951 a 1958)

Segundo Brasil Gerson em Histórias das Ruas do Rio, o nome da rua é homenagem : … a Viúva Dantas ( dois Dantas vizinhos dos Cardosos) … do Sargento Mor José Cardoso dos Santos, sem dúvida o patriarca desses Cardosos espalhados de Campo Grande a Cascadura e vizinhos do capitão José Luis Dantas.

Para responder nossa pergunta no segundo parágrafo precisamos entender a trama da história. Teremos que conhecer os Cardosos e Dantas citados por Brasil Gerson, para isso contamos com a luz de Manoela da Silva Pedroza em Engenhocas da Moral.

Marcos Cardoso dos Santos e sua mulher,Úrsula Martins ,estabeleceram-se na fazenda Cabuçu que compraram em 1748, onde casaram seus dois filhos ( Marcos e José) com duas irmãs ‘de fora’ , em 1765. Os três casais viveram juntos na casa grande até que Marcos filho se mudou para uma porção de terras vizinha da família, onde construiu e passou a administrar um novo engenho de cana, conhecido como do Rio da Prata do Cabuçu a três léguas da Matriz de Campo Grande, como constava no relatório de 1793.

Ao seu lado, o irmão José Cardoso dos Santos, sucessor do pai, sargento-mor, parecia gerir com mão de ferro o patrimônio na porção original de Cabuçu. Os problemas da gerência dos bens da família começaram quando se desfez a sociedade de Marcos filho com a mãe ( viúva em 1777) na administração do novo engenho.

Por outro lado, havia os conflitos com seus vizinhos que começaram: em 1798, Úrsula Martins havia entrado com a primeira ação contra seu vizinho, Bernardo José Dantas, que supostamente lhe usurpava 500 braças de terras nos confins de seu terreno. Em 1802, esse vizinho acusou José Cardoso dos Santos e seus filhos, com a ajuda de dezenas de escravos, de destruírem plantações de cana e madeira cortadas por ele e outros.

Quem seria Bernardo José Dantas ? Apareceu pela primeira vez em Campo Grande no relatório de 1794. Ele era o senhor do engenho de Juari, que já constava no relatório de 1777, mas com outro senhor: Vitorino Rodrigues Rosas.

Brasil Açucareiro : Revista Quinzenal dirigida pela Comissão de Defeza da Producção do Assucar (RJ) – 1932 a 1979

Dantas de família desconhecida, seu nome ou o de sua família não aparecerem nos registros de casamento e batismo da freguesia, ele não deixou nenhum processo nem inventário em seu nome, o que significa dizer que não se conhecia seu passado nem seus antecessores.

Era somente um recém- chegado, comprador do engenho em fins do século XVIII, que brigou com todos os seus vizinhos. Trinta anos depois, viúvo, preferiu ele próprio vender suas terras a um grupo de compradores recém-chegados, e sair da freguesia, para desespero dos quatro filhos . Dantas vendeu todas as suas terras em Campo Grande em 1828, desaparecendo da região.

Os filhos de Dantas ( Maria Teresa, Marcolina , Ana Maria e Luiz José ) se casaram com vários herdeiros da Fazenda de Cabuçu, além de vizinhos próximos. Segundo Pedroza , Luiz José Dantas se casou com Maria Inácia, filha de Manoel Cardoso dos Santos Paiva e Maria Teresa de Jesus e neta do Sargento Mor José Cardoso dos Santos . Sendo assim, o destino dos filhos de Dantas se misturava ao dos herdeiros da Fazenda Cabuçu.

Luis José Dantas, a partir da década de 1850, já era capitão e um dos ‘principais lavradores de café e mantimentos’, passando por produtor de aguardente e proprietário, até a década de 1880, atividade mantida por sua viúva e filhos em 1883“.

Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro (RJ) – 1844 a 1885

Comparamos as árvores genealógicas na obra de Pedroza e no acervo de Family Search e embora haja distorções quanto ao pai e mãe da viúva, em ambos coincide o nome de Maria Inácia Paiva ou Maria Ignacia Paiva , e seu cônjuge Luiz José Dantas , o que nos leva a crer ser este o nome da viúva que dá nome a rua de Campo Grande.

Outro personagem histórico no bairro de Campo Grande e em comum com a Viúva Dantas é o vigário Belisário dos Santos. A viúva seria, segundo a linha de Pedroza prima em quarto grau do vigário, pois os dois descendem do dizimeiro Marcos Cardoso dos Santos, senhor das terras do Cabuçu.